segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Uma ovelha na sopa

Catarina Portas. "Uma ovelha no prato da sopa". Foi no Alto Alentejo que ganhou as melhores memórias de Natal. Na casa dos avós Portas, a mesa era imensa e a família numerosa - , em Vila Viçosa, viveu natais cheios de rituais. Criou uma mesa onde brilha um serviço de motivos tradicionais que quase dispensa outras decorações.

A mesa vai ser posta no restaurante Belcanto, que tem uma entrada mesmo em frente d' A Vida Partuguesa, a loja de Catarina Portas no Chiado, em Lisboa. Dentro do restaurante, todos tentam ajudar. Vai ser posta uma mesa para quatro mas juntam-se seis mesas, que o serviço de mesa é imponente e precisa de espaço para respirar. "Uma mesa de Natal deve ter cor, deve ter beleza, deve ter calor e graça", explica a empresária de 41 anos.

No dia em que preparou a mesa de Natal para a Pública, Catarina Portas teve uma contrariedade. Deveria ter inaugurado o segundo andar d' A Vida Portuguesa (Rua Anchieta, 11, Lisboa), mas teve de cancelar a abertura planeada para coincidir com as vendas de Natal porque a entrada da rua foi obstruída par umas obras. Os comerciantes deveriam de ter sido avisados, defende. "Não tinha planeado a abertura do segundo andar para este momenta e teria investido em painéis que dissessem às pessoas que a loja está aqui, que a rua não está fechada."

Por causa desse segundo andar, andou pelos armazéns da fábrica Viúva Lamego, no Intendente de Lisboa, e encontrou um serviço "perfeito" para uma mesa de Natal. Completou-o com os tradicionais copos de diamante da Marinha Grande, na versão Atlantis, e da sua loja, onde se vendem produtos e objectos tipicamente portugueses (desde as andorinhas Bordalo Pinheiro a mantas de lã regionais), vieram as ovelhinhas com guizo. Vão direitinhas para dentro das tigelas da sopa. "Adoro as ovelhas, é o pormenor popular e caloroso. E deve haver urn bocadinho de surpresa."

Há dois anos, Catarina Portas celebrou urn Natal ali mesmo, no Belcanto. "Aconteceu porque hoje em dia tenho uma vida um bocadinho complicada e andávamos todos desencontrados. Então fizemos aqui um Natal, eu, os meus irmãos (os políticos Miguel e Paulo Portas, do BIoco de Esquerda e do CDS-PP, respectivamente), o meu pai (o arquitecto Nuno Portas) e os meus sobrinhos. Foi no dia 23 de Dezembro. Foi aqui porque adoro o Belcanto, é um sítio onde me sinto em casa, quando eu estou doente fazem-me uma canjinha... Tambem era o sítio onde eu sabia que podia chegar a horas!"

De outros natais, tem memórias menos apressadas. "Guardo mais memória dos natais em casa dos meus avós paternos, os Portas, em Vila Viçosa. Era muita, muita gente e a mesa era muito comprida e cheia de comida e de doces. Havia dois doces muito importantes, eu esperava o ano inteiro para os comer. São os meus doces favoritos à face da terra: os nógados, uma espécie de torta feita um torrão, é uma massa, são feitos canudinhos, são cortados, fritos e envoltos em mel; as filhoses enroladas, que é uma tira grande de massa que é enrolada enquanto se frita, é uma obra. Infelizmente, com o desaparecimento dos meus avós, esse Natal desapareceu e tenho algumas saudades." Era uma celebração cheia de rituais: os Portas jantavam cedo e, depois, parte da família ia à Missa do Galo "numa capela muito bonita", em Trena. Os que ficavam em casa conversavam na sala de fumo e esperavam o regresso dos outros. "Quando estávamos todos, cantavamos canções de Natal alentejanas e, depois, abríamos os presentes. Ficávamos a brincar até tarde, ou a jogar à canasta com as tias-avós, e havia uma segunda mesa da ceia."

Havia árvore de Natal - uma tradição que, explica Catarina Portas, só chegou a Portugal com o rei D. Luís, assim como a figura do Pai Natal, e há desenhos que mostram o monarca vestido de vermelho e de saco de brinquedos as costas. E havia urn presépio antigo de peças de madeira. Mas, explica Catarina Portas, vivia-se sobretudo a tradição alentejana: "Eu cresci com essa tradição, que tem a ver com a mesa farta, e com a música, estou a tentar lembrar-me de uma letra em que o menino comprava chapeuzinho. São letras engraçadas, que têm muita ingenuidade e transformam o menino numa criança travessa, um bocadinho como o do Alberto Caeiro."

Catarina Portas, claro, ainda celebra o Natal, Mas até às sete horas do dia 24 está a trabalhar. "A minha visão sobre o Natal mudou bastante desde que tenho uma loja - percebi também a importância comercial do Natal."

Texto de Ana Gomes Ferreira e fotografias de Enric Vives-Rubio. A convite da revista Pública, Catarina Portas preparou uma mesa de Natal original e cem por cento portuguesa.

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