sexta-feira, 29 de outubro de 2010

"Sempre gostei de investigar histórias"

Quiosques de Refresco, espaços d' A Vida Portuguesa e agora também A Vida Republicana, loja do Porto, entre vinte seleccionadas a nível mundial pela prestigiada revista Wallpaper. Qual o denominador comum? Catarina Portas, a senhora que se segue. E a senhora que todos seguem. Texto de Mónica Franco, revista Sábado.

O jornalismo está posto de parte? Fui freelancer durante muito tempo, excepto enquanto estive na RTP e na Marie Claire. Neste momento, não escrevo; fazia as crónicas para o Público, mas agora até tenho a carteira de jornalista suspensa. Quero começar a fazer uns livros para o ano. Já tenho um livro grande todo planeado, pesquisado, só falta fotografar e escrever. Chamar-se-à Vinte Marcas, Fábricas e Produtos Antigos Portugueses e terá muito material: packaging, publicidade antiga... Vai incluir todos os artigos que estão nas fábricas e que praticamente ninguém conhece. descobri uma secção gigante de etiquetas de hotéis antigas portuguesas, lindas, e queremos fazer um pequeno livro só com isso.

Como descobriu esse material? Neste momento, aparece-me muita coisa, desde as velhinhas com uns livros que têm em casa e vêm emprestar-me ao senhor que tem uma papelaria velha, fechada há trinta anos, e que vem perguntar-me se quero cadernos antigos. Quero, claro! Não é que façamos grande negócio com isso, mas são pormenores que ficam engraçados na loja, estas coisas antigas... No entanto, a nossa vida são os produtos actuais, mesmo que eles tenham um ar antigo.

No início, foi difícil desenterrar o passado? Tudo começou com uma ida às fábricas, a tentar criar uma relação com elas. Hoje em dia, há uma série de fábricas com as quais trabalho e a que não chamaria fornecedores, mas parceiros. A Ach. Brito, por exemplo, é nossa sócia na loja do Porto, e fazemos coisas em exclusivo com eles.

De repente, surgiu esta nova vaga, um gosto pelo antigo... Acho que senti uma coisa que, depois, veio a concretizar-se. Quando comecei este negócio, há cinco canos, de facto, havia uma atitude um bocadinho diferente. Nós mudámos muito desde então, começámos a falar sobre o passado, mesmo em termos históricos. Não se falava sobre o Salazar, era um tabu. E as pessoas associavam muito estas marcas antigas portuguesas a um período de pobreza, a produtos que não tinham qualidade. Faziam uma série de associações muito perniciosas para estes produtos. O que fiz foi uma investigação para ver o que existia e que produtos se fabricavam há várias décadas ainda com uma grande dose de manufactura e, de preferência, ainda vendidos nas suas embalagens de origem ou inspiradas nas originais. Isto é que me pareceu ser o truque para fazer entrar estes produtos no mercado do design, como design histórico e design retro. Pareceu-me que era uma hipótese de arranjar uma nova clientela. Mas o meu raciocínio não foi muito elaborado... Pensei: eu gosto muito disto, isto vai desaparecer e deve haver mais gente como eu (risos).

Quem faz a investigação dos produtos hoje em dia? Continuo a ser eu. Hoje, é mais fácil. Quase todos os dias recebemos propostas de produtos. O nosso core-business são marcas antigas mas, às vezes, num caso ou noutro, por um motivo ou por outro, fugimos a isso. Por exemplo, os cadernos Serrote. Têm um design mais actual mas ainda imprimem em tipografia e não em offset. Ou os sacos da Rosa Pomar. Além de gostar muito do trabalho dela, usa chitas.

Abrem cada vez mais lojas similares... Quando comecei, o que queria era que estas fábricas não morressem. Que voltassem a vender e tivessem mais clientes. Por isso, não tenho problema nenhum com a abertura de lojas que sigam mais ou menos o nosso preceito. Se as fábricas fecharem, eu também não tenho negócio. Vendo muito, já tenho tamanho para encomendar cinco ou dez mil peças, mas não o suficiente para manter uma fábrica. E faço produtos exclusivos também, por isso, estou defendida.

O que reserva o futuro? O nosso projecto principal é o d' A Vida Portuguesa. Temos as lojas em Lisboa e no Porto. (Esta última abriu em Novembro de 2009). A do Porto foi a primeira loja portuguesa a entrar no retail Directory da revista Wallpaper, entrou nas vinte e tal lojas que eles escolheram pelo Mundo inteiro em 2010, ao lado de outras como a Comme des Garçons de Hong Kong, a Missoni de Los Angeles, a Hermès não sei de onde. É extraordinário! Parece mentira, não é?

Considera-se uma pessoa retro? Sempre gostei de investigar histórias mas nunca fui uma pessoa que vive no século XIX ou nos anos 20. Sempre gostei de antiguidades. O segundo marido da minha mãe é um coleccionador e eu ia muito a antiquários e a feiras de antiguidades com ele. Já tinha alguma sensibilidade. E na adolescência queria ser antiquária ou antropóloga.

1 comentário:

Anónimo disse...

Excelente! Tive um tempo livre hoje então resolvi traduzir a entrevista toda para o inglês. Mais pessoas precisam saber do trabalho fixe que ela faz!

http://eyesonportugal.wordpress.com/2010/11/06/catarina-portas-interview/

Abraços

- Adam